Tuesday, November 06, 2012

Tendo




Como se não te tivesse,
Assim te amo,
Como se morasse longe,
Fosse figura de quadro,
Como se não acordasse e te visse ao lado,
Como se não espalhasse a mão e encostasse em você.

Amo ainda como se não encontrasse seu cheiro,
Não soubesse exatamente o formato de todos os seus riscos,
Como não te tivesse tanto e cada dia mais.

Disfarço e dificulto o acesso,
Fingindo poeticamente que não está tão ao lado,
Sendo que está.
Finjo que sofro de amor,
Pra enganar a felicidade,
Pra ela não ir embora.


Bom é fingir que não vai mais ver,
Só pra ser surpresa encontrar quando chegar a noite.
Bom é amar e ter,
Mesmo fingindo que não,
Só pra brincar de infelicidade no amor.

Sunday, August 19, 2012

Os escolhidos

E nós, pequenos pontos de luz arificial, adornando a vastidão do universo natural.
Nós, que juntos praticamos muito pouco além do mal,
que ignoramos, por exemplo, o amor, somos nós que preenchemos o vazio tão pequeno que é o outros.
Somos nós que não percebemos a grandeza das coisas próximas, que não observamos, porque não conhecemos sobre ângulos, o tapete denso de nuvens que se forma baixo sobre nossas cabeças e nos impede, humanos, de um contato com o céu.
Nós que fomos condenados a pisar no chão,
e arrastamos com os pés nossas cabeças que também não saem do chão.
Nós, de sentidos infinitos que não usamos.
Nós tão poucos.
Nós tão nada.
Nós que esperamos a chegada de uma força superior que nos salve,
confirmando assim que nós mesmos não somos capazes de nos salvar.
Nós que choramos-rimos-choramos.
Nós que mais uma vez nada.
Fomos nós que herdamos o presente de viver aqui.
Nós que nem prestamos atenção.
Nós que somos baixos, que enxergamos apenas 90 graus a nossa imediata frene.
Nós que nem vemos nada.
Foi a nós.

Sunday, July 01, 2012

70 dias



Você que pede um poema
Toma.
Você não pede.
Manda.
Faço.

O que pediu e não fizeram?
O que fez sem que pedissem?
Pede, amor, eu faço.
E faz pra mim o que eu não peço.

Pede o que acredita que não pode ganhar.
E o que acredita também pede.
Pede o que acredita.
E acredita no que pede.
Ninguém fez?
Pede.
Faço.

Monday, June 18, 2012

Home alone

Teríamos uma casa. Muito muito nossa, com alguns objetos japoneses, com algumas peças minimalistas e valiosas, com dragões. Teríamos na cozinha uma faca muito especial, talheres e pratos muito pesados, coloridos talvez. Teríamos no banheiro uma orquídea, assim como na árvore lá de fora, onde mora Carolina, sua orquídea mais antiga. Teríamos toalhas claras, como gostamos. Teríamos uma cama muito gostosa, com travesseiros os quais colocaria no meio das pernas pra dormir, travesseiros que roubariam os lugares onde eu poderia me encaixar em você. Teríamos um divã onde eu gostaria muito de colocar uma colcha de retalhos, pra cobrir os pés enquanto lia textos de amor a noite. E você estudava. Sempre vai ser estudante. Na área teria uma mesa pequena (e nós juraríamos toda vez que seus tios saíssem que compraríamos uma maior, com mais cadeiras e redonda), sobre a mesa alguns livros de fotografia, só pra enfeite. Na sala de televisão teríamos o conforto dos dias vagos. Sofá comprido. Muitíssimas almofadas. Tudo muito colorido com as cores e bonecas que eu trouxe da casa dos meus pais. E você, como o melhor homem do mundo, amaria cada coisinha que eu trouxesse de Pirenópolis, incluindo o abajur do canto e os tapetes muito rústicos. Teríamos ainda um quarto sobrando para quando nossos irmãos decidissem vir ( que viessem muito, muitas vezes, trazendo com eles suas particularidades que só aceitamos em um irmão). E teríamos amor. Amor demais. Em todos os cantos e objetos. Não teríamos uma área comum, já que você nunca gostou de pessoas invadindo a casa, mesmo quando a casa não era sua. Mas teríamos nosso ateliê, nosso lugar favorito. Onde você faria os desenhos mais lindos, onde tocaria as notas mais tristes a as anotaria num caderno que é sua cara, e o lugar onde escreveria os textos mais complexos de saúde, de bem estar. Nesse lugar também faria seus exercícios de luta. E mais amor.

Monday, August 02, 2010

Poema a quem se comunica (Tanto eu, quanto você)


Você ama seus próprios olhos pois sabe do poder que eles têm.
Eu não poderia não os amar também.

Nossos amores comuns.

Nós temos amores parecidos. Amamos juntos a palavra.
Mas como em nós tudo é diferente a amamos de formas distintas:
Você a ama pra convencer,
pra consquistar,
usa a palavra a seu favor.
Eu amo pra sentir,
e muitas vezes elas me traem,
me expõem,
me escapam.

Você usa as palavras para tocar as pessoas.
Eu as uso para tocar você.

Nossos amores opostos.

Tuesday, February 09, 2010

Lugar (a sutileza de vir)


Hoje entrou aqui um pedacinho da sua casa:
Primeiro a sala e as guitarras, CDs e livros no cano, com poeiras, fotos e papeizinhos que são sua cara.
Depois foi entrando devagar o corredor, e à esquerda o espelho que é velho e estragado do lado esquerdo, e que tem no canto a frene o pau-de-chuva que trouxeram pra você daquela cidade que não me lembro o nome (Friburgo, Petrópolis?), tanto faz.
Por último meu preferido:
O quadrado composto e quente e úmido que abriga você para mim nos dias que não estou. O útero que abriga os sentimentos que estão prestes a nascer, ou aqueles que terão gestação longa. É também o luga que me abriga e eu gosto porque tem os restos de tudo o que usou no dia: sapatos, roupas, toalhas.
As vezes me lembro dessa umidade e calor.
Veio até mim cada canto, devagar e detalhadamente, lugares que eu gastaria páginas pra detalhar, como num livro realista.
Depois tudo vai embora devagar, um por uma saindo do meu quarto, e o que fica são os olhos do gato a me olhar preguiçoso, e seus olhos, também preguiçosos, mas a se despedir tristes, tantos os seus quanto os meus. Eu disse que o meu preferido era o quarto, retiro: são os olhos... que se fecham fácil e se abrem despercebidos pra me olhar e dizer: Vamos?

Friday, September 11, 2009

O homem que queria contar o mundo


Num lugar tão longe, e num tempo tão atrás que nós não conseguimos imaginar muito bem, vivia um homem que estava cansado de todos os dias contar ovelhas. Para cada ovelha que passava pelo seu cajado o homem colocava uma conta, e assim, passadas todas as ovelhas, uma a uma, o homem com seu saco cheio de contas saía para subir o morro e levar seus animais pra comer em lugar de grama mais verde. Como o rebanho por bem teimava de crescer, o homem tinha a cada dia uma conta a mais pra carregar, e não findando seu trabalho ele se tornou cansado pelo desgaste de cada dia carregar mais contas.
A cada amontoado de contas o homem deu um nome. Essa era uma idéia sua. O nome ele escolheu como quis. Agrupava agora as ovelhas! Se eram muitas chamavam “cem”. Se eram menos chamava “trinta”. Até que se nascesse uma preta e ele quisesse a colocar sozinha, a chamava “uma”. Desse modo o homem não mais precisou levar sacos com contas. E tudo ficou mais bonito. Se o céu ficava estrelado ele não cansava de levantar a cabeça e agrupar as estrelas: Cinco, vinte, cinqüenta, cem... mil... como são muitas! ele aprendeu que existe o muito, e depois aprendeu que existe o pouco. Ele aprendeu também que existem coisas que não podem receber nomes, porque são tantas tantas, a essas coisas ele chamou de infinito, de longe, de tudo. O homem teve uma idéia de quantas coisas existem no mundo sobre a que não sabemos, sobre a que não podemos amontoar ou dar nomes.
Aos nomes que dava ao grupo de coisas ele chamou “números”. Ensinou para todos sobre os números. As pessoas então começaram a se ver assim. De dois em dois, de cinco em cinco. E não mais como representações naturais do que seriam os grupos. Em tudo existia a idéia de quantidade. Daí então, para cada “cinco” pesos de grãos, “uma” ovelha. Para cada “três” amontoados de trigo, “um” pedaço de couro. A sua gratidão, a ternura pelo que trocava já não estava na conta, pois essas coisas não se pode numerar. Agora era mais justo usar os números para que todos tivessem a mesma quantidade.
Mas a notícia dos números não chegou igualmente em todas as partes do mundo. Enquanto em alguns lugares as pessoas faziam seus cálculos (que agora já não eram somente pedrinhas), outras ainda não sabiam da novidade, e viviam do modo de contar anterior, ordenando as coisas em suas equivalências. Pesando em suas trocas também os seus sentimentos e seus valores. Ali, uma flor poderia ser trocado por uma roda, dependia do que ela representava pra alguém. Já para os que conheciam os números isso não acontecia. Tudo tinha peso e medida. As pessoas que souberam primeiro sobre os números juntaram tantas coisas que poderiam agora fazer grandes trocas com aquele pessoal que não aprendeu a contar. Desses dois povos, que jamais souberam se equivaler, foram surgindo outros povos, que carregavam consigo as mesmas informações e desinformações que seus antepassados.
O homem que inventou os números, quando viu que sua ciência havia deixado as coisas tão complicadas, chorou “mais de cem lágrimas”, calculou. Ele soube que tinha “cinco” filhos, “uma” esposa, mas que ele mesmo, nunca poderia ser nomeado com um simples número, e isso o fez se sentir fora do mundo.
Ele não sabia que em outras partes do mundo, já haviam inventado coisinhas que se juntavam para darem sentidos a coisas maiores, que estariam muito bem se não fossem descobertas ou nomeadas.
Até hoje tem gente que não entende o que o homem queria dizer, outros fingem que não sabem que muita gente ainda não aprendeu a usar “números”, e ainda têm aqueles que fazem piada com a ciência dele.