Sinestesia (ou sábados sicários)

"...a emoção acabou, que coincidência é o
amor, a nossa música nunca mais tocou."
Cazuza
Nesse momento, espero que breve,
pensei nos sábados nossos.
Tão nossos que não merecem um adjetivo,
Somente esse pronome o pode o qualificar.
Nem pão, nem água,
Somente o quarto,
Na sua função simples,
Nos era suficiente.
E todo o mundo fora de lá
Tinha milhares de quilômetros,
O quarto era grande,
Desproporcional ao insignificante tamanho do universo.
E lá já não fazia chuva,
Nem sol,
Nem frio,
Nem calor,
No quarto, sinestésico,
A temperatura tinha cheiro,
E o cheiro tinha cor,
E todas as cores tinham luz,
Porque todo aquele universo tinha você.
Eu tinha você,
E até você ainda tinha você.
Todos os gestos eram lentos,
Mesmo os mais bruscos
E todas as sensações eram inesquecíveis,
Mesmo as mais comuns
Todos os sexos
Mesmo os não orgásticos.
Todas as mãos se juntavam,
Todos os corpos do universo eram atraídos por você,
Esse sol atraente,
Sustentador,
Enérgico.
Quando a tarde terminava,
Terminava também o dia,
Porque já não havia mais sentido existir luz.
Não havia o barulho desinteressante da TV,
Nem os reflexos idiotas do sol lá de fora.
Porque as atenções eram tantas às nossas respirações
Que esquecíamos que os outros seres vivos também respiravam,
Ousando,
Possuir também um pedaço do universo.
Depois da tarde, antes de chegar outro dia,
Durante o “tempo perigoso” do dia,
No qual a vida não clama mais por nada
Eu ainda sentia você,
Inteiro,
Calmo e presente.
E continuaria a sentir ,
Por todos os dias,
Todos os anos,
Toda vida;
Não fosse você ter esquecido essa energia em algum lugar,
Não fosse a ocorrência da demolição daquele pequeno universo,
Do qual os cacos voaram
E acertaram pessoas,
Me acertaram em cheio.
Sangrou.
E por causa de uma cicatrização mal feita,
As vezes ainda escorre você,
Que ainda circulava na veia,
No antigo tempo de pulsação.
Aquelas tardes...
1 Comments:
"Aquelas tardes...", agora, foram substituídas por essas manhãs: plenas, em que leio escritos tão lindos quanto esse... Ainda não sei se se supera a cada poema, ou se se mostra cada vez mais, numa degradé de explendor.
Parabéns... beijos =)
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